Cada um escolhe por qual janela olhar

quinta-feira, 16 de julho de 2009

“Você sempre trocando, já não trocará mais”

Já fui obrigada a ir a missa, já toquei no piano “Para Elisa”.
Já aprendi a falsear meu sorriso, já caminhei pela cornija. Já troquei de lugar minha cama, já fiz comédia e já fiz drama. Já fui honesta e já fui desonesta, já me passei por boa e já tive má fama. Já fui ético e já fui lúbrico, já fui cético e fanática, já fui abúlico, fui metódico, já fui impúdico e fui caótico. Já li Artur Conan Doyle, já me passei de nafta a gás óleo, já li Breton, e Moliere, já dormi em colchão e em estrado, já troquei a cor do cabelo, já estive contra e já estive a favor.
O que me dava prazer agora me dá dor, já estive do outro lado no balcão e ouço uma voz que me fala sem razão: “Você sempre trocando, já não trocará mais”, e eu estou cada vez mais igual e já não sei o que fazer comigo.
Já me afoguei em um vaso de água, e plantei café em Nicarágua. Já fui tentar a sorte nos EUA, já joguei roleta russa, já acreditei nos marcianos, já fui ovo-lacto-vegetariana. São, fui quieta e fui sedutora, já estive tranqüila e já estive em prantos.Já fiz curso de mitologia, mas os deuses riam de mim. Ourivesaria passei raspando, e ritmologia, aqui estou a aplicando.
Já provei, já fumei, já tomei, já deixei, já assinei, já viajei, já peguei, já sofri, já iludi, já fugi, já assumi, já fui, já voltei, já fingi, já menti. E entre tantas falsidades, muitas das minhas mentiras [algumas escritas aqui] já são verdades. Fiz fáceis adversidades e me compliquei nas ninharias e já ouço uma voz que me fala com razão: “Você sempre trocando, já não trocará mais”, e eu estou cada vez mais igual e já não sei o que fazer comigo. Já fiz um lifting, coloquei piercing, fui ver o Dream Team, e não houve feeling, tatuei o Che em uma nádega, em cima de Mami para que não saia.
Já ri e não me importei de coisas e pessoas que agora me dão medo. Já jejuei por besteira, já me entupi com frango no spiedo. Já fui ao psicólogo, fui ao teólogo, fui ao astrólogo, fui ao enólogo, já fui alcoólico e fui lambeta, já fui anônimo e já fiz dieta, já joguei pedras e cusparada nos lugares onde agora trabalho. E meu dossiê conta por empreitada, que me comportei bem e que armei calmaria e ouço uma voz que me fala sem razão: “Você sempre trocando, já não trocará mais”, e eu estou cada vez mais igual e já não sei o que fazer comigo.

Nenhum comentário: